05 set de 2018
Brasil – Agricultura – Agricultura brasileira: do arado ao chip

Da tração animal à inteligência artificial, a incrível evolução da mecanização agrícola no Brasil

Foto: divulgação/John Deere.

De um passado não tão longínquo, onde o trabalho no campo era pre dominantemente manual ou movido a bois e cavalos e se afirmava solenemente que a tecnologia disponível das máquinas no Brasil estava defasada 30 anos em relação ao hemisfério norte, aos dias de hoje onde alguns lançamentos de produtos ocorrem antes aqui do que nos Estados Unidos ou Europa, transcorreram um pouco mais que 50 anos. Mas as máquinas recebiam outras críticas, como a de causarem desemprego, lá nos anos 1970, e de que incentivavam o êxodo rural. Um relato da época expressa, conforme nos revela a história, diz que nos anos 60 o então ministro da Agricultura Hugo de Almeida Leme (governo Castelo Branco), professor da Esalq/SP em mecanização, ministrou palestra em que incentivou agricultores a comprarem tratores, mas recebeu críticas de que isso causaria desemprego. O crítico disse que 10.000 tratores seriam suficientes para tornar o Brasil um gigante na produção agrícola, mas causariam muito desemprego, e preferiam trabalhar com muares. Hugo Leme fez os cálculos: se um trator de 55 cv substituía 55 muares, para 10.000 tratores seriam necessários 550.000 muares, e perguntou “onde o Brasil encontraria uma burrada tão grande?”.

Mesmo agora nos anos 2000 os produtores de cana-de-açúcar também foram acusados de causar desemprego ao adotarem a colheita mecânica, exigência de ambientalistas para acabar com as queimadas. Mera discussão política, até mesmo de caráter ideológico, pois a colheita mecânica foi adotada, hoje já é de quase 100% no estado de São Paulo, e a mão de obra nem foi dispensada, foi treinada, qualificada e formada para outras atividades nas lavouras e nas usinas, com ganhos na renda dos trabalhadores. Ao contrário, chega a faltar mão de obra qualificada para operar as atuais máquinas agrícolas.

É um tempo relativamente curto, quando se trata do desenvolvimento de bens de capital e da histórica carência de recursos das nossas instituições em P&D (Pesquisa e Desenvolvimento). Entretanto, alguns fatos desencadearam nosso processo de desenvolvimento: primeiro, o Plano de Metas do presidente Juscelino Kubitschek, lançado em meados dos anos 1950, que tinha como lema “cinquenta anos em cinco”, e que atraiu um grande número de empresas, entre as quais diversas indústrias de máquinas agrícolas; o segundo fato foi a criação da Embrapa em 1973, que aportou conhecimento científico ao campo, transformando o cerrado brasileiro na maior fronteira agrícola do mundo.

O terceiro fator decisivo neste processo de conquista do cerrado, que ocorreu de forma natural e não planejada como as anteriores, foi a migração de grandes levas de agricultores do Sul e Sudeste do país para o Centro-Oeste em busca de um futuro mais promissor para seus filhos. Nesta corrida para o cerrado, dois produtos se destacaram: a cultura da soja, hoje considerado o grão de ouro que mudou a história do Brasil, transformando o nosso país, em pouco mais de meio século após sua introdução, no maior produtor mundial desta oleaginosa, e, de outro lado, os tratores CBT que de tão populares passaram a identificar tipos de cerrados em anúncios de venda de fazendas. Aliás, aqueles tratores, originalmente desenvolvidos para as planícies do meio oeste americano, não tinham no sistema de freios sua característica principal de eficiência, e logo muitas histórias davam conta que as lâminas frontais da Tatu eram a mais eficiente solução para frear aqueles tratores no campo.

Muito da infraestrutura até então inexistente na região, como estradas, pontes, hidrelétricas, hospitais, escolas, foram construídas pelos próprios agricultores, individualmente ou reunidos em cooperativas, entretanto, muitas dessas deficiências de logística ainda persistem na região central do país nos dias atuais, dificultando a nossa competitividade em termos mundiais. Do plantio direto, na década de 70, tecnologia importada que abrasileiramos e nos tornamos insuperáveis em competitividade, passando pelas inovadoras duas safras ao ano na década de 90, até chegarmos à ILPF nos dias atuais, a estrutura do agronegócio no Brasil foi evoluindo constantemente, principalmente pelo conhecimento que desenvolvemos de produzir em ambiente tropical. Nisso somos campeões mundiais, reconhecidos mundo afora pela nossa competência e criatividade, com a ajuda divina através do clima, é claro, pois dizem que Deus é brasileiro.

Com a abertura gradual dos mercados ao redor do mundo e a crescente globalização da indústria de máquinas agrícolas nos últimos 20 anos, muitas tecnologias disponíveis e modernas no hemisfério norte passaram a ser produzidas e comercializadas ao redor do mundo, inclusive no Brasil, acelerando a sua oferta em regiões nem sempre aptas ao uso eficiente dos pacotes tecnológicos ofertados.

Lamentavelmente, esta massiva oferta de tecnologia para o campo não foi precedida da adequada formação de profissionais para atuarem neste novo mercado, por meio da modernização dos nossos sistemas de ensino, pesquisa e extensão rural. Da mesma forma, a inexistente infraestrutura de telecomunicação no meio rural, por exemplo, torna muitos avanços tecnológicos vendidos aos clientes em meros enfeites das máquinas, sem a menor utilidade prática aos seus usuários.

Entretanto, o futuro não espera e o desenvolvimento tecnológico não pode ser freado com uma lâmina frontal, como se fazia na época dos tratores CBT; startups nascem aos borbotões a cada dia e a inteligência artificial já é uma realidade nas nossas máquinas agrícolas. Portanto, é hora de arregaçarmos as mangas e liderarmos as seguintes iniciativas, porque o futuro tem de ser feito hoje:

– fortalecer a Embrapa e todo o sistema de pesquisa agropecuário tropical, pois sem ciência não existirá um agro forte;

– acelerar a inversão do êxodo rural de jovens, trazendo para o campo este contingente que se urbanizou, mas tem raízes no campo;

– atrair capital privado para investir em infraestrutura de logística, conectividade e formação de profissionais;

– criar um sistema de certificação de origem das propriedades agrícolas brasileiras, que produzem de forma sustentável, com o objetivo de agregar valor aos nossos produtos no mercado externo;

– incentivar os produtores rurais a estabelecerem uma entidade associativa nacional, com representatividade plena, de ação e natureza política, para defender os interesses deles próprios em temas institucionais;

– restabelecer um sistema de assistência técnica que leve aos pequenos produtores rurais as tecnologias disponíveis nos institutos de pesquisas, que permitam aos mesmos buscarem a sustentabilidade de sua sobrevivência com dignidade no campo;

– implantar um sistema de seguro rural moderno que atinja a todos, e que tenha também o seguro de renda. Nossos principais concorrentes no mundo inteiro fazem isso. Por que só o Brasil continua de fora?

*Artigo originalmente publicado na edição 101 da revista Agro DBO.

*As opiniões expressas nos artigos não necessariamente refletem a posição do Portal DBO.

 

Fonte: Portal DBO

 

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