07 maio de 2017
Brasil – Agricultura – Cenário nebuloso

Por: Carlos Guimarães Filho

Medidas recentes criam condições adversas para a triticultura paranaense.
Tendência é de que o país continue importando grandes quantidades do produto argentino

Na mesma proporção que avança o plantio da safra 2017 de trigo no Paraná, maior produtor nacional, cresce a preocupação dos agricultores que apostam na cultura de inverno. Medidas recentes definidas pelos governos federal e estadual e o crescimento significativo das importações criaram condições de mercado desfavoráveis para quem semeia o cereal do pão na safrinha. Prova disso está na redução de 8% na área dedicada ao trigo no Estado, conforme levantamento do Departamento de Economia Rural (Deral) da Secretaria Estadual da Agricultura e do Abastecimento (Seab). Os triticultores paranaenses irão dedicar apenas 990 mil hectares na atual temporada,
quarta queda estadual consecutiva.

 

O primeiro baque sentido pelo setor veio com a disparada nas importações de trigo. De acordo com Centro de Estudos Avançados em Economia Aplicada (Cepea), o país comprou 5,1 milhões de toneladas do cereal no mercado internacional, principalmente da Argentina, entre agosto de 2016 e março deste ano, aumento de 46% em relação ao mesmo período na temporada passada. Este montante é o maior da série histórica de 21 anos da entidade. Na contramão, o volume das exportações despencou 43%.

Na sequência, o segundo golpe aconteceu com o anúncio do governo federal de redução de 3,6% nos preços mínimos. No caso do trigo “pão” tipo 1 na região Sul, por exemplo, o preço mínimo foi reduzido para R$ 37,26 por saca de 60 quilos, ante R$ 38,65 na temporada 2016/17.

 

“O produtor já vem um tanto desanimado, por questões climáticas e a falta de liquidez no pós-colheita. Os preços e as condições de pagamentos no exterior estão mais atrativos, o que derrubou ainda mais as cotações internas. Vem na sequência o governo e reduz o preço mínimo. Não há sinais de que o pessoal irá investir efetivamente na cultura”, explica Lucilio Alves, analista do Cepea e professor da Escola Superior de Agricultura Luiz de Queiroz (Esalq/USP). “Os produtores que permanecem no trigo é em função da necessidade de fazer a rotação de cultura ou por não existir outra possibilidade no inverno, como ocorre nos Campos Gerais”, reforça Ricardo de Aguiar Wolter, presidente do Sindicato Rural de Carambeí.

 

Para completar a série de adversidades, no último mês de março, o governo estadual elevou de 2% para 8% a alíquota do Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS) sobre o trigo comercializado com São Paulo, Rio de Janeiro e Minas Gerais. O mercado paulista é o principal consumidor do trigo paranaense fora do Paraná.

 

“O trigo paranaense está bem posicionado na questão de consumo, principalmente por conta da qualidade. Mas o aumento do ICMS para os estados do Sudeste pode ser que dificulte a comercialização, principalmente se o preço no mercado internacional não subir”, lamenta Daniel Kümmel, presidente do Sindicato da Indústria do Trigo no Estado do Paraná (Sinditrigo/PR). “Com a queda no volume no Paraná, abre mais espaço para trigo da Argentina, principalmente em São Paulo”, complementa.

 

Diante de tantos percalços, a FAEP tem atuado para mitigar os problemas enfrentados pelos triticultores paranaenses. No final de abril, a entidade encaminhou ao Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (Mapa) um pedido de R$ 20 milhões para a subvenção ao prêmio do seguro rural do trigo ainda no primeiro semestre. A proposta busca o equilíbrio na distribuição de subvenção para culturas de maior risco climático e evitar o endividamento de parte dos produtores numa hipótese de ocorrência de problemas com o clima.

Avanço do milho

 

O desânimo dos triticultores paranaenses abriu espaço para o avanço do milho, apesar de a cotação do grão também registrar queda nos últimos meses. A área prevista para o milho safrinha é de 2,4 milhões de hectares, crescimento de 8% em relação à safra anterior.

“De forma geral, no momento de decisão da safra de inverno, tinha mercado mais favorável para o milho no Paraná. E muitos migraram. Em regiões do Estado que não entra o milho, fica a dúvida, pois o pessoal está relutando em plantar trigo”, aponta Alves.

 

Para o presidente do Sinditrigo/PR, essa mudança de comportamento por parte do produtor causa apreensão. O motivo é a possibilidade da queda na qualidade do trigo produzido no Estado. “O milho avança em áreas nobres para o trigo. Os moinhos [são 66 espalhados pelo Estado] produzem produtos especializados. E o trigo paranaense encaixa com essas linhas especiais de panificação. Essas áreas onde o milho passou a atuar são, historicamente, estratégicas para ter um trigo de alta qualidade”, adverte Kümmel.

Conforme o levantamento da Seab, o Paraná deve atingir a produção de 3,1 milhões de toneladas, 9% menor em relação à safra passada. Mesmo assim, o Estado segue como o principal produtor do país, com participação de 53% no montante nacional.

 

Futuro incerto

 

Assim como o momento atual, o futuro do trigo também é nebuloso. Os consecutivos golpes recebidos pelos produtores colocam um ponto de interrogação sobre o planejamento das próximas safras e a possibilidade de retomada da cultura. “Precisamos de políticas públicas para reverter à situação”, afirma o presidente do Sinditrigo/PR. “Além disso, precisa existir uma aproximação maior dos moinhos com o campo. Acordar um valor para dar liquidez à produção”, complementa.

 

Desde 2014, quando a área dedicada ao cereal do pão atingiu 1,4 milhão de hectares, a cultura vem registrando consecutivas reduções. Para o analista do Cepea, o setor precisa tomar uma decisão definitiva em relação à cultura no Brasil. “Ou se faz pesquisa e investimento para o crescimento da cadeia ou passamos a importar o produto de outros países e usamos a área para produzir outros alimentos. Precisamos chegar a uma definição social: se o melhor é investir ou assumir a posição de importador”, diz Alves.

Fonte: Sistema FAEP

Publicado em: Boletim Informativo – A revista do Sistema FAEP

Texto originalmente publicado em:
Sistema Faep
Autor: Carlos Guimarães Filho

 

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