Este trabalho teve como objetivo comparar, para algumas localidades, coeficientes de cultura (Kc) e lâmina líquida de irrigação requerida (LIR) do milho
Autores: Crisálida Alves Correia(1); Paulo Emílio Pereira de Albuquerque (2); Wander Lauro de Amaral(3); Christoph Hermann Passos Tigges(3).
Trabalho disponível nos Anais do Evento e publicado com o consentimento dos autores.
RESUMO: A otimização na produção do milho está relacionada a diversos fatores, dentre eles a disponibilidade hídrica. Para tanto, em cultivos irrigados, é fundamental determinar as necessidades hídricas dessa cultura para ajustar as práticas de irrigação. Este trabalho teve como objetivo comparar, para algumas localidades, coeficientes de cultura (Kc) e lâmina líquida de irrigação requerida (LIR) do milho, por meio de três métodos: a) observação de dados experimentais; b) dados experimentais ajustados; e c) estimativas, segundo o manual FAO-56 (Allen et al., 1998). Em algumas regiões os valores de Kc recomendados pelo FAO-56 foram ligeiramente superiores aos obtidos experimentalmente, superestimando a lâmina líquida de irrigação requerida (LIR) para aquelas condições experimentais. Para os municípios de Piracicaba (SP), Seropédica (RJ) e Teresina (PI) os valores de LIR obtidos com os dados de Kc pelo FAO-56 foram inferiores (de 0,9 a 8,3%) aos valores experimentais e ajustados, respectivamente. No geral, os valores de Kc do manual FAO-56 levaram a uma boa estimativa da lâmina líquida de irrigação requerida (LIR) para a cultura do milho, pois a LIR variou no intervalo entre -10% e +10% ao compará-la com dados experimentais e ajustados por polinômio de terceiro grau para os valores de Kc em função dos dias após o plantio (DAP).
Termos de indexação: evapotranspiração da cultura (ETc), requerimento hídrico, eficiência do uso da água.
INTRODUÇÃO
Dados do IBGE indicam que o milho está distribuído em 2801 municípios, em várias regiões do Brasil. Essa cultura já se tornou a segunda maior “comoddity” no país, sendo que nos últimos cinco anos houve um aumento de 15,5% na produtividade. A otimização na produção está relacionada a diversos fatores, dentre eles a distribuição hídrica, que influencia principalmente na fase de germinação, floração e enchimento de grãos (Sans et al., 2001).
Para tanto, em cultivos irrigados, é necessário determinar as necessidades hídricas dessa cultura para ajustar as práticas de irrigação. Isso permite a utilização da água de maneira eficiente e a expressão do máximo de potencial produtivo da cultura. Desse modo, segundo Chaves et al. (2005), uma das alternativas utilizadas no manejo de irrigação é obter a evapotranspiração da cultura (ETc), a evapotranspiração de referência (ETo) e o coeficiente de cultura (Kc) durante os estádios de desenvolvimento das plantas. Essas variáveis dependem principalmente da cultura, de elementos meteorológicos e do solo, podendo ser estimadas diretamente através de lísimetros ou indiretamente através da seguinte equação:
Em que:
ETc = evapotranspiração da cultura (mm dia-1);
Kc = coeficiente de cultura;
ETo = evapotranspiração de referência (mm dia-1).
O coeficiente da cultura ou de cultivo está ligado a fatores ambientais e fisiológicos das plantas, nas quais deve ser determinado, de preferência nas condições do local que será utilizado (Medeiros et al., 2004).
Neste sentido, objetivou-se realizar um comparativo, para algumas localidades, entre coeficientes de cultura (Kc) do milho, por meio de três métodos: a) observação de dados experimentais; b) dados experimentais ajustados; e c) estimativas, segundo o manual FAO-56 (Allen et al., 1998). Deste modo, observou-se, então, a influência que esses três métodos têm no manejo de irrigação.
MATERIAL E MÉTODOS
Primeiramente, realizou-se um levantamento bibliográfico de vários trabalhos técnicos e técnico-científicos acerca dos coeficientes de cultura (Kc) do milho obtidos nas condições brasileiras.
Posteriormente, elaborou-se uma base de dados, utilizando planilhas eletrônicas, seguindo o critério de localidade e da época de plantio encontrados na literatura para cada região. Para a análise dos dados, o ciclo da cultura foi dividido em quatro fases (estádios) de acordo com Doorenbos & Pruitt (1977) e com o manual FAO-56 (Allen et al., 1998), segundo Albuquerque (2007), além do trabalho de pesquisa original.
A equação mais adequada para descrever e ajustar a curva de coeficiente de cultivo (Kc) foi a polinomial de terceiro grau. Os dias após o plantio (DAP) e Kc foram as duas variáveis analisadas conjuntamente. A determinação dos valores mínimos e máximos dos valores de Kc, em função do DAP, foi obtida pela primeira derivada da função polinomial encontrada.
O ajustamento do Kc recomendado pelo FAO-56, para a fase inicial (Kc-ini), média (Kc-med) e final (Kc-fin) foi obtido, respectivamente, pelas equações 2 (Albuquerque et al., 2001) e 3 (Allen et al., 1998):
A primeira equação apresenta valores de frequência de irrigação ou de chuva (F, em dias) e evapotranspiração de referência (ETo, em mm dia-1). E, para o Kc médio e final, utilizaram-se valores decendiais de umidade relativa mínima do ar (URmin, em %) e velocidade do vento a 2 m de altura (u2, em m s-1), correspondente a cada município.
O manejo de irrigação para os dados experimentais, ajustados e recomendados pelo FAO-56 foram simulados em planilha eletrônica, segundo Albuquerque (2007), sob condições de umidade inicial do solo equivalente a 50%, aspersão convencional com precipitação de 10 mm hora-1 e turno de irrigação médio previsto para a fase 1 de 3 dias. A ETo necessária para uso na planilha de manejo de irrigação foi obtida observando-se a época de desenvolvimento do milho, de acordo com a localidade.
As lâminas de irrigação requeridas (LIR), para todos os três métodos, foram obtidas da planilha de manejo de irrigação. Os valores de LIR obtidos dos dados experimentais e ajustados foram comparados aos de LIR do FAO-56 com a seguinte equação:
LIRexp/ajust = Lâmina Líquida de Irrigação Requerida para dados experimentais ou ajustados, respectivamente;
LIRFAO = Lâmina Líquida de Irrigação Requerida para dados do FAO-56.
RESULTADOS E DISCUSSÃO
Na Figura 1, pode-se analisar a correlação entre coeficiente de cultura (Kc) recomendado pelo FAO e o obtido por Almeida et al. (2013) e Santos et al. (2014), para a região de Mossoró – RN. Nesses trabalhos utilizaram a cultivar AG 1051, com semeadura em maio de 2010 e em novembro de 2011, respectivamente.
Na Figura 1A e na Tabela 1 observam-se que os dados do FAO-56 refletiram em um aumento na lâmina de irrigação requerida (LIR) de 9,56 e 8,59% em relação aos dados experimentais e aos ajustados, respectivamente (Tabela 1). Verifica-se que os valores de Kc experimentais variaram pouco em relação aos valores ajustados, o que é demonstrado pelo alto coeficiente de determinação (R2). O Kc experimental da fase 3 apresentou valor aproximado ao recomendado pelo FAO (Figura 1A). Neste caso, a LIR pelo método do FAO-56 está superestimada, o que significa que o Kc recomendado pelo FAO-56 não seria o mais adequado para aquelas condições experimentais.
Figura 1: Coeficiente de cultura (Kc) obtidos do manual FAO-56, de dados experimentais e ajustados, em relação aos dias após plantio (DAP), segundo Almeida et al. (2013) (1A) e Santos et al. (2014) (1B).
No trabalho descrito por Santos et al. (2014) para o milho verde, verifica-se que os valores de Kc experimentais não concordaram com os recomendados pelo FAO durante todo o ciclo da cultura (Figura 1B). Porém, no total do ciclo, não houve diferenças consideráveis na LIR, o que resultou numa proximidade entre a quantidade de irrigações (Tabela 1). Dessa forma, os valores de Kc, para o milho verde, recomendados pelo FAO-56 podem ser utilizados quando cultivados sob as condições edafoclimáticas do município de estudo. Nota-se que na fase 3 o Kc ajustado do FAO ficou subestimado em relação ao Kc experimental . Essa fase é a que apresenta os maiores valores de Kc, visto que corresponde ao estádio de florescimento até o início de enchimento de grãos (Albuquerque & Guimarães, 2004) e coincide com o período crítico da cultura, em que acontecem os maiores impactos causados pelo déficit hídrico, refletindo na redução da produção de grãos (Bergamaschi et al., 2004).
Souza et al. (2012) e Detomini et al. (2009) desenvolveram um trabalho para o milho grão nas cidades de Seropédica – RJ (Figura 2A) e Piracicaba – SP (Figura 2B), respectivamente. Nesta ordem, utilizaram a cultivar Eldorado, com semeadura realizada em dezembro de 2006, e o híbrido DKB 390, semeado em 24 de novembro de 2005.
Analisando os dados apresentados na Figura 2A, nota-se que o Kc inicial para todos os métodos não variou consideravelmente. Condição contrária à verificada da Figura 2B, em que o Kc inicial recomendado pelo FAO-56 se mostrou relativamente maior ao Kc experimental e ajustado. Com isso, o número de irrigações aplicadas, com base no método do FAO, teve maior expressão comparada aos outros métodos.
A metodologia utilizada pelo manual FAO-56, para a estimativa do Kc, também considera fatores climáticos diários, como a umidade relativa do ar e a velocidade do vento. Possivelmente, as variáveis climáticas nas condições experimentais, durante a fase inicial, estão bem próximas das consideradas pelo FAO (Figura 2A). O período inicial de desenvolvimento da cultura está compreendido entre os meses de maiores precipitações pluviométricas, interferindo no teor de umidade do solo que, por sua vez, afeta o requerimento hídrico das culturas (Mendonça et al, 2007), diminuindo a diferença entre os métodos.
A LIR obtida pelo Kc do FAO-56 não atende a demanda hídrica do milho na região de Seropédica – RJ, sendo que a LIR resultante do Kc experimental e ajustado se mostrou de 8,29 a 4,78% maiores que a recomendação do FAO-56, respectivamente. No entanto, para a cidade de Piracicaba, somente a LIR calculada pelo Kc experimental que se mostrou significativamente maior em relação ao Kc do FAO-56. O Kc polinomial não refletiu expressivamente em maior LIR, praticamente se igualando aos valores do FAO-56 (Tabela 1). Para tanto, o manejo de irrigação nos dois casos permanece o mesmo.
Figura 2: Coeficiente de cultura (Kc) obtidos do manual FAO-56, de dados experimentais e ajustados, em relação aos dias após plantio (DAP), segundo Souza et al. (2012) (2A) e Detomini et al. (2009) (2B).
Na cidade de Teresina – PI, Ferreira et al. (2007) determinaram valores médios de coeficiente de cultura para o milho CMS 47, semeado em agosto de 2006 (Figura 3). Nota-se que o Kc inicial dos dados experimentais e ajustados diferiu em relação ao FAO-56. Neste trabalho, maiores LIR foram determinadas para valores ajustados, refletindo em maiores quantidades de irrigações (Tabela 1). Muitos produtores de milho têm utilizado o Kc do FAO-56, uma vez que é um processo muito trabalhoso obtê-lo experimentalmente (Souza et al., 2012). No entanto, em muitas localidades, como em Teresina – PI, diferenças no manejo de irrigação podem ocorrer devido às condições de solo e comportamento das condições climáticas, o que influenciam nas necessidades hídricas da cultura com consequentes reduções de produtividade. Levar em consideração o Kc experimental é importante para utilização da água de maneira eficiente, otimizando a produção da cultura.
Figura 3: Coeficiente de cultura (Kc) obtidos do manual FAO-56, de dados experimentais e ajustados, em relação aos dias após plantio (DAP), segundo Ferreira et al. (2007).
CONCLUSÕES
As estimativas dos valores de Kc pelo manual FAO-56 propiciaram boas estimativa da lâmina líquida de irrigação requerida (LIR) para a cultura do milho em diferentes regiões brasileiras, pois a LIR variou no intervalo entre -10% e +10% ao compará-la com dados experimentais e ajustados por polinômio de terceiro grau para os valores de Kc em função dos dias após o plantio (DAP).
AGRADECIMENTOS
À Agência Nacional de Águas (ANA) e à Embrapa, agradecemos pelo apoio financeiro.
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Informações dos autores:
(1) Acadêmica de Engenharia Agronômica, Universidade Federal de São João del-Rei, UFSJ, Bolsista Embrapa; Sete Lagoas, MG;
(2) Pesquisador da Embrapa Milho e Sorgo, Eng. Agrícola, D.Sc., Embrapa Milho e Sorgo;
(3) Acadêmico de Engenharia Agronômica, Universidade Federal de são João Del Rei, UFSJ, Bolsista Embrapa.
Disponível em: Anais do XXXI Congresso Nacional de Milho e Sorgo. Inovações, mercados e segurança alimentar. Bento Gonçalves, Rio Grande do Sul, 2016.