Por Maristela Franco – maristela@revistadbo.com.br 

Inspetor da ABA avalia animais no curral de espera do frigorífico, observando seu padrão racial

Uma das iniciativas de articulação de cadeia mais bem-sucedidas do mercado, com crescimento anual superior a 20%, o Programa Carne Angus Certificada completa 15 anos de existência em 2018. E tem motivos para comemorar. De 2003 a 2017, ele certificou mais de 3 milhões de cabeças, que forneceram, até abril deste ano, 102.000 toneladas métricas de carne.

 

O programa fechou 2017 com 500.000 animais certificados (41.660/mês), uma produção de 32.000 t em equivalente carcaça ou 27.000 t métricas; 15 empresas frigoríficas parceiras (40 plantas industriais), 50 técnicos e mais de 6.000 produtores cadastrados em 12 Estados brasileiros.

 

São números impressionantes para um programa que começou em Porto Alegre, RS, em março de 2004, ofertando aos consumidores apenas 2.305 kg de carne certificada, por meio de uma parceria da Associação Brasileira de Angus (ABA) com a rede de supermercados Zaffari e o Frigorífico Mercosul, mais tarde vendido à Marfrig Foods.

 

“Nós ensaiávamos algo assim desde 1988. Fizemos várias tentativas, mas enfrentamos a resistência dos frigoríficos, que não aceitavam a presença de técnicos da associação dentro de suas plantas para avaliar as carcaças. O Mercosul foi o primeiro a quebrar esse paradigma e o Zaffari o primeiro a comprar a ideia de vender carne com nosso selo”, relembra Reynaldo Titoff Salvador, diretor do Programa Carne Angus, hoje o maior da América Latina e segundo maior do mundo, perdendo apenas para o dos Estados Unidos, que já tem 40 anos de estrada.

“Estamos recém debutando, mas criamos um modelo de articulação de cadeia completamente diferente, com foco em coomarketing, ou seja, atribuímos valor às marcas dos parceiros que vendem carne da raça. Construímos mercado junto com eles. Foi isso que nos fez crescer. Os norte-americanos já optaram por criar e promover uma marca comercial, a Certified Angus Beef”, explica o executivo.

 

Tripé sólido

Por sua trajetória, o selo de certificação da ABA obteve, em fevereiro deste ano, o registro no Instituto Nacional de Propriedade Intelectual (INPI). Foi a primeira vez que o órgão reconheceu uma marca de certificação no setor pecuário, pois ele referenda apenas processos de auditagem independentes. Quem emite o selo não pode estar envolvido no processo de comercialização do produto. “Hoje, se alguém nos disser: quero auditar vocês, a gente pergunta: quando?”, assegura o gerente do programa, Fábio Schuler Medeiros, que nele trabalha desde 2004. “Quando fui contratado, aos 24 anos, tínhamos apenas uma descrição em papel dos pré-requisitos para um animal ser classificado como Angus; hoje, cada passo da certificação é especificado, auditado e informatizado”, destaca.

Segundo José Roberto Pires Weber, presidente da ABA, a rigidez na aplicação das normas é uma das razões do sucesso do programa.

Primeira parceria: Reynaldo Salvador (à esq.) com Mauro Pilz, do Mercosul, e executivos do Zaffari.

“Já começamos, em 2003, seguindo um padrão de classificação e recebemos muitas críticas do tipo: ‘Ah, mas falta apenas 1 kg para o peso mínimo, é um absurdo desclassificar’. Nunca cedemos a essas pressões, por isso o programa alcançou a credibilidade que tem hoje”, reforça. Depois da parceria como o Mercosul-Zaffari, o segundo momento mais importante do programa foi o trabalho de estruturação de processos em 2005, sob orientação da certificadora australiana Aus-Meat.

Marcos Molina, da Marfrig, em divulgação do programa, em 2007.

“Precisávamos responder à pergunta: quem garante que a certificação de vocês é eficaz? A Aus-meat assinou embaixo, em 2006. A partir daí, o programa começou a se autocatapultar”, explica Fábio Medeiros. Não sem antes chegar ao Centro-Oeste.

Nessa mesma época, a ABA conseguiu arregimentar dois importantes parceiros: a Marfrig Foods e a VPJ Alimentos, que ajudaram a promover o programa nos principais Estados pecuários do País. Já surfando na “nova onda” do cruzamento industrial, mais focada em raças britânicas, essas duas empresas passaram a premiar produtores que lhes fornecessem animais com no mínimo 50% de genética Angus, no padrão de carcaça estabelecido pela associação, visando à produção de carne de qualidade.

Paulo Marques (de terno) com executivos do McDonald’s e Fábio Medeiros (dir.), em 2011.

Visibilidade e exportação

Com a adesão de grandes frigoríficos e empresas especializadas à iniciativa, marcas comerciais com o selo “carne angus certificada” começaram a ser ofertadas nas gôndolas dos supermercados, permitindo maior aproximação com o consumidor final. Porém, foi a partir de 2010 que o programa ganhou seu mais poderoso “garoto-propaganda”: o McDonald’s, considerado um grande brand maker (formador de marcas). A rede de fast food lançou um sanduiche com carne Angus certificada e o manteve em seu cardápio por sete anos, quando a média de permanência de produtos classificados como novidade (fora da “família Core”, composta por sanduíches que nunca saem de linha, como o Big Mac e o Quarteirão) é de no máximo seis meses.

Carcaças tipo exportação.

O quinto momento foi seu reconhecimento como protocolo de rastreabilidade pelo Ministério da Agricultura, que abriu as portas do mercado internacional à carne Angus certificada. Até então, as indústrias não podiam exportar cortes com o nome da raça estampado na embalagem, principalmente para países da Europa, que exigem validação do órgão governamental competente, no caso o Mapa.

 

“Descobrimos isso quando começamos a participar de feiras internacionais, a convite da Associação Brasileira das Indústrias Exportadoras de Carne (Abiec), em 2013. Faltava uma base legal para reconhecimento oficial do nosso trabalho, o que somente conseguimos, em 2015, com a inclusão do programa na Plataforma de Gestão Agropecuária do Mapa (PGA), administrada pela Confederação Nacional da Agricultura e Pecuária do Brasil (CNA). Desde então, temos feito um trabalho de formiguinha para fomentar a exportação de carne Angus certificada”, diz Medeiros. Já foram vendidas 1.000 t de cortes com o selo para a Arábia Saudita e a União Europeia, que pagam preço 50% superior ao da média nacional.

 

Metas futuras

Segundo Salvador, a meta do Programa Carne Angus é chegar a 1 milhão de cabeças certificadas até 2020, marcar presença nos 15 principais Estados pecuários brasileiros, ampliar a participação do produto certificado pela ABA no mercado internacional e tornar seu selo mais conhecido no mercado interno.

“Temos feito um trabalho mais intenso neste sentido, participando de eventos Brasil afora, como as churrascadas e festivais gastronômicos; realizando mais edições da Angus Beef Week (quando restaurantes ofertam apenas carne certificada); ampliando o número de estabelecimentos autorizados a incluir a marca Angus no cardápio; investindo no projeto Varejo 100% Angus (no Paraná, já são 20 açougues) e promovendo ações pela internet”, explica Salvador.

Uma história de sucesso

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

Matéria publicada na Revista DBO – edição junho de 2018

Fonte: Portal DBO

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