Sendo assim, neste 22 de março, Dia Mundial da Água, os brasileiros tem pouco o que comemorar e muitos desafios pela frente, e um dos principais é o reaproveitamento da água, uma prática ainda pouco relevante no País. Para se ter uma ideia, segundo o estudo da Confederação Nacional da Indústria (CNI) “O Impacto Econômico dos Investimentos de Reúso de Efluentes Tratados para o Setor Industrial”, de 2018, menos de 1% da oferta de água no país provém de reúso de efluentes tratados. Enquanto isso, em Israel, país que convive com a escassez desde sua origem, 70% da oferta vem da reutilização de efluentes.
Estima-se que o reúso de água não potável seja de 2m³/s, uma vazão ínfima perto do total da água retirada no País, 2.083 m³/s segundo dados do estudo Conjuntura dos Recursos Hídricos no Brasil, de 2018. A meta proposta pelo governo federal é que o reúso não potável direto no Brasil alcance 13 m³/s até 2030.
E é frente a esse desafio ambiental enorme que iniciativas como da indústria de laticínio Marajoara, localizada na cidade goiana de Hidrolândia, a 36 quilômetros de Goiânia, merecem ser aplaudidas e copiadas. A empresa inaugurou recentemente um inovador projeto de fertirrigação desenvolvido em que direciona a água residual de seus processos fabris, que é tratada de sua própria Estação de Tratamento de Resíduos (ETE), para uma área de pasto vizinha à sede da indústria.
“O nosso sistema de tratamento da água por flotação assegura uma eficiência superior a 90%, bem mais do que os 60% exigidos pela legislação ambiental. Com esse projeto de fertirrigação conseguiremos dar uma destinação mais sustentável para essa água”, diz o presidente do Grupo Marajoara, André Luiz Rodrigues Junqueira. O projeto recebeu reconhecimento nacional com o Prêmio Crea de Meio Ambiente.
Por meio de tubulação e bombeamento, os tanques de água tratada foram ligados a um pasto de 160 mil metros quadrados, situado a um quilômetro da indústria. A área foi dividida em 15 setores. Cada um recebe, em média, uma hora de irrigação por dia. Seiscentos aspersores foram instalados no local para lançar a água, fazendo com que cada gota seja muito bem aproveitada. Assim, mesmo durante a seca, o pasto mantém-se vertiginoso e o pecuarista consegue criar seis vezes mais cabeças do que no manejo tradicional.
Aquíferos
Da concepção do projeto até o início das obras para sua instalação, no fim de janeiro, foram necessários seis meses de estudos técnicos no solo da área e outros quase cinco meses para aprovação junto da Secretaria Estadual de Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável (Semad).
De acordo com a bióloga Daniela Souza Silva, diretora da Ecovel, empresa que assessorou ambientalmente a Marajoara, o projeto também, a médio prazo, servirá como um importante mecanismo de recarga dos aquíferos locais ou lençóis freáticos. “Com esse sistema de fertirrigação, parte da água é absorvida pela planta, no caso o capim do pasto, parte é evaporada e uma parte significativa vai para o lençol freático”, explica a consultora.
O projeto de fertirrigação é uma continuidade de um outro projeto de sustentabilidade da empresa, que é desenvolvido há pouco mais de dois anos a partir da ETE da Indústria: é o uso da biomassa, que é extraída dos efluentes após o processo de tratamento, virando fertilizante. Esse adubo é fornecido a pequenos produtores rurais em Hidrolândia. Rica em nutrientes importantes para o gado leiteiro, a mistura é aplicada no pasto dessas pequenas propriedades, assegurando uma produtividade e qualidade para alimentação dos animais, e o que é melhor, sem agredir o meio ambiente.